Descrição
Nossa época é marcada por aquilo que veio a ser chamado “deriva emocional”, a primazia dada ao sentimento sobre a razão e às paixões em relação à inteligência. Nossa civilização colocou a emoção em primeiro lugar. A consequência direta disso é a impossibilidade de qualquer discussão genuína, já que o debate civilizado exige certa reserva, uma suspensão temporária do juízo, com o intuito de permitir que as partes se entendam. Nosso tempo, em vez de ser a era do “diálogo”, da “abertura” e do “pluralismo”, não é senão a era do slogan, do espírito obstinado ao ponto da intolerância, do pensamento uniforme. Pode-se colocar assim a questão (se é que vale propô-la): “Como chegamos a um tal impasse social e cultural?”.
É, pois, a essa questão que a presente obra se endereça indiretamente. O cristianismo antigo privilegiava a verdade doutrinal, a discussão intelectual pormenorizada, a controvérsia, a refutação sistemática dos erros. Por conta disso, foi um poderoso instrumento educativo, um fator crucial para o desenvolvimento de uma alta civilização na qual a conversação, a discussão e o ensino desempenhavam um papel social eminente.
Mas com a influência — que hoje se tornou predominante no mundo religioso — daquilo que nossos autores chamam de “misticismo”, é a emoção que passou a dominar. A comunhão com Deus pela mediação do Verbo tomou um caminho inesperado e mortal, isto é, o caminho da fusão, da união irracional, da confusão intelectual, moral e espiritual. Afinal, é evidente que não se pode provar uma emoção experimentada, de maneira que não é possível fazer dela objeto de uma discussão. Num outro momento, a verdade guiava a vontade, conduzindo-a a uma emoção genuína, matizada e forte. Hoje em dia, entretanto, uma emoção-pulsão indiferenciada assumiu a precedência, movendo arbitrariamente nossa volição, ao passo que a razão é relegada a uma função conveniente: justificar ideologicamente as aberrações de uma emoção carnal desenfreada.
Por meio da análise das obras de indivíduos que se destacaram ao longo da história da espiritualidade cristã — Madame Guyon, John Wesley, a Sra. Penn-Lewis, Watchman Nee, John Wimber, Rick Joyner e outros —, nossos autores buscam retraçar algumas das etapas desse predomínio da emoção sobre a fé, do sentimento religioso sobre a doutrina, das paixões sobre a inteligência. Seguindo por sendas históricas que, à primeira vista, parecem simples vias transversais, nossos autores lançam luz sobre a deriva de nossa civilização, seu desvio espiritual que conduziu aos impasses que obstam toda possibilidade de propor ou deliberar soluções às dificuldades de nossos tempos — tempos (como já dito) dos slogans, dos ultimatos, dos ditames e da pura violência.